Cannes | Com Johnny Depp, Jeanne du Barry contrapõe polêmicas com abordagem sem ousadia - Crítica do Chippu

Cannes | Com Johnny Depp, Jeanne du Barry contrapõe polêmicas com abordagem sem ousadia - Crítica do Chippu

Com Johnny Depp no elenco Jeanne du Barry contrapõe polêmicas nos bastidores com abordagem sem ousadia

Guilherme Jacobs
16 de maio de 2023 - 3 min leitura
Crítica

CANNES: Quando o nome de Maria Antonieta é mencionado pela primeira vez em Jeanne du Barry, filme dirigido e estrelado por Maïwenn que abriu as atividades no Festival de Cannes deste ano, qualquer amante de história francesa já pensou, ao menos uma vez, na futura rainha. Quando a duquesa austríaca enfim aparece, qualquer cinéfilo já pensou, ao menos uma vez, na cinebiografia dela realizada por Sofia Coppola. Os paralelos, enquanto longe de absolutos, são óbvios. Ambos longas-metragens se passam nos últimos anos da realeza na França, com a Revolução iminente pairando como um fantasma inescapável, e ambos são protagonizados por uma mulher indesejada pela corte.

A menção e subsequente aparição de Maria Antonieta sugerem que Maïwenn, como a audiência, está ciente do contexto histórico e cinematográfico de Jeanne du Barry - a obra sobre o caso infame do Rei Luís XV (Johnny Depp) com a então plebéia Jeanne Bécu (Maïwenn), que para passar mais tempo com seu amante é colocada como condessa, lhe permitindo passar seus dias em Versalhes, próxima do monarca e escandalizando outros membros do palácio, em especial as filhas da coroa. Se tal ciência existe, porém, ela recebe um mero reconhecimento da diretora. Na execução de seu filme, porém, Maïwenn pouco tem a adicionar a esse legado. Na verdade, ela parece contente em repetí-lo.

Jeanne du Barry constrói uma típica história de peixe fora d’água envolvendo a entrada de alguém da classe comum no mundo de excesso, um conceito encenado por Maïwenn em inúmeras cenas tingidas de humor ou desconforto cujo intuito é óbvio. Ela pode ser considerada estranha pelos nobres mas, pasmem, a audiência percebe que estranhos mesmos são os condes e duques ao seu redor. Chocante, eu sei. Se há um clima de polêmica, ele existe muito mais nos bastidores — Maïwenn admitiu ter cuspido num jornalista e Johnny Depp não requer introdução — pois na tela as tensões e faíscas estão totalmente ausentes. Deixando as controvérsias por trás das câmeras, o filme oferece pouquíssimas oportunidades de nos envolvermos.

As poucas que vêm aparecem pelo humor. Os momentos mais lúdicos destoam do tom mais sóbrio da narrativa, mas são bem-vindos por permitirem Maïwenn exercer seus músculos como atriz de comédia. Grandes risadas não virão, mas Jeanne du Barry está mais vivo quando sua protagonista sorri e se deixa fazer de boba. Quando outros personagens como o fiel assistente La Borde (Benjamin Lavernhe) se incluem na brincadeira, encontramos o caminho para nos envolvermos com o que em outras instâncias se mostra um filme vazio sobre pessoas vazias. Lavernhe, na verdade, é o melhor ator do grupo e se salva justamente por, com um simples olhar ou entonação, informar mais sobre a vida interior de La Borde do que todo o roteiro de du Barry faz com qualquer figura. Através desta perspectiva, esses círculos sociais ganham o ar de um jogo onde há perdedores e vencedores. O risco, as apostas, enfim se apresentam.

Acertando onde o texto fala, Lavernhe tem como seu oposto Depp, cujas falas de cinco ou seis palavras no máximo (um fruto de seu francês engessado) são acompanhadas com a atuação de alguém sem química com qualquer pessoa com quem contracena. Isso é mais danoso, claro, quando ele precisa nos convencer da incessante paixão de Luís XV por Jeanne, um amor que deveria servir como motor para todo o drama, mas que termina apenas sublinhando as incertezas de Jeanne du Barry. O filme, percebemos, parece mudar de opinião de cena em cena sobre os temas de monarquia e divisão de classe.

Se estamos com Jeanne e sem Luís, vemos esse universo como um de preconceito e ignorância. Mas quando o casal está em meio a suas supostas faíscas apaixonadas, Maïiwenn passa a ter um olhar mais bondoso. O problema, novamente, é que não há nada ali para justificar isso, a ideia acaba sendo apenas mais uma das propostas apresentadas mas não exploradas no roteiro de Maïwenn, Teddy Lussi-Modeste e Nicolas Livecchi. Adicione à lista a liberdade sexual feminina, a escravatura e um drama entre mãe e filha.

Sentimos a cineasta buscando exceções. Sem questionar, desconstruir ou preencher com novas cores, Jeanne du Barry caminha dentro de um conhecido formato de cinebiografias históricas, em especial no contexto de reis e rainhas. Sua protagonista é uma gritante e participante nessa dinâmica de poder. Seu nome deve se destacar nos livros, mas se julgássemos através desse tedioso filme, sua história fez muito barulho por nada.

2/5

Nota da Crítica
Guilherme Jacobs

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