Sundance: Anne Hathaway brilha na desequilibrada adaptação de Eileen - Crítica do Chippu

Sundance: Anne Hathaway brilha na desequilibrada adaptação de Eileen - Crítica do Chippu

A coadjuvante é ótima, mas Thomasin McKenzie não consegue segurar o holofote como protagonista do filme de William Oldroyd

Guilherme Jacobs
25 de janeiro de 2023 - 6 min leitura
Crítica

Eileen (Thomasin McKenzie) é uma garota de 24 anos trabalhando na prisão de uma cidade pequena nos anos 1960. Ela está desesperada para fugir de tudo — seu emprego, sua comunidade local, sua vida sexual encostada e, talvez acima de tudo, seu pai alcoólatra (Shea Whigham, claro). Para isso, ela fantasia. Seja o sexo com um guarda no emprego, o assassinato de seu pai com a própria arma dele ou, em medidas extremas, até mesmo o suicídio. Essas são suas rotas de fuga.

Então, o tédio cotidiano é interrompido quando uma nova psicóloga chamada Rebecca Saint John (Anne Hathaway como uma fantástica Marilyn Monroe) começa a trabalhar com os presidiários, e desperta algo em Eileen. A natureza exata do que é despertado é ambígua. Talvez seja um interesse romântico por mulheres, talvez um desejo atiçado especificamente por alguém mais velha — um exemplo a ser imitado — ou talvez uma simples curiosidade por algo que foge do padrão.

A entrada de Hathaway serve como a explicação ideal para os sucessos e fracassos do filme. Eileen, a personagem e o filme, precisam da energia de alguém como Rebecca, interpretada pela atriz de O Diabo Veste Prada com um gosto venenoso por cada fala como a Miranda Priestly de Meryl Streep, substituindo a acidez por um flerte incógnito. Ela pode estar apenas se divertindo com sua jovem colega. Ela pode realmente querer algo a mais. Hathaway permite que ambas possibilidades existam de forma simultânea e não contraditória, e Oldroyd sabiamente não nos dá uma resposta final sobre suas intenções.

Sejam elas quais forem, o fogo iniciado pela mulher acende o filme e sua figura central. Em termos da obra, o roteiro de Moshfegh e Goebel brilha quando oferece à garota titular alguém interessante com quem conversar, alguém cujo mistério levanta inúmeras possibilidades intrigantes, e nesse processo, nossa heroína ganha novos tons. Isso vale, também, para a atuação de McKenzie. Longe da sua femme fatale, a atriz retrocede como a personagem, repetindo de certa forma a ingenuidade de Noite Passada em Soho e até de sua pequena participação em Ataque dos Cães. Eileen pode ser muitas coisas, mas ela não é ingênua.

Isso se prova o maior erro do longa. Apesar de talentosa, McKenzie ainda não apresenta as ferramentas necessárias para destrinchar sua personagem para além do texto, e sofre nos momentos menos movimentados. Ao lado de Hathaway, ela consegue não ser engolida e eventualmente toma o holofote, mas sozinha ou com Whingham em cenas pouco inspiradas, ela não consegue segurar o filme em pé.

O segundo ato é o que mais sofre com esse vai e vem de atriz, personagem e longa-metragem. Então, Rebecca convida Eileen para um jantar em sua casa, e numa só fala muda nosso entendimento completo do destino da história. Ligando a relação de Eileen e Rebecca com o caso de um paciente da psicóloga que matou o pai, a narrativa é interligada com a da mãe do garoto (Marin Ireland, praticamente roubando o filme até de Hathaway com um monólogo digno de prêmios), e entramos no território de pulp, enfiando de vez o pé no acelerador até chegarmos na simples, mas poética conclusão.

Essa montanha-russa pode até ser intencional, nos levando do contido ao empolgante, do rotineiro ao extraordinário, para nos colocar nos pés da protagonista, mas cabe aos cineastas e à estrela de Eileen deixar até essas pausas envolventes, e aproveitá-las para aprofundar sua figura central. Não faltam possíveis direções. Seja se apoiar mais na natureza de suspense erótico, seja explorar mais a relação da garota com sua falecida mãe, contra quem ela se rebeldia (ou homenageia) vestindo suas roupas, ou usando algum dos coadjuvantes pouco aproveitas, como Jefferson White e Owen Teague, para colorir os arredores

A fotografia rica em textura de Ari Wegner e a trilha sonora imersiva de Richard Reed Parry operam nesse nível mais completo de cinema, onde Hathaway e Ireland também chegam. Às vezes, particularmente na conclusão, a direção de Oldroyd e a atuação de McKenzie sincronizam com esses outros elementos. Como Eileen, porém, eles ocasionalmente também se desligam por completo.

3/5

Nota da Crítica
Guilherme Jacobs

0h 0min
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