Jogo Justo mira em Garota Exemplar e cai no melodrama

Jogo Justo mira em Garota Exemplar e cai no melodrama

Primeiro ato do filme de Chloe Domont com Phoebe Dynevor e Alden Ehrenreich aumenta as esperanças, mas conclusão deixa a desejar

Guilherme Jacobs
6 de outubro de 2023 - 5 min leitura
Crítica

O primeiro ato de Jogo Justo vai aumentar suas esperanças. Esse quase suspense erótico de Chloe Domont começa com faíscas voando entre Emily (Phoebe Dynevor, de Bridgerton) e Luke (Alden Ehrenreich, de Oppenheimer), dois jovens com carreiras promissoras no mundo das finanças em Wall Street e uma paixão fervorosa um pelo outro. Com exceção do escritório, onde seu romance precisa ser escondido porque quebra regras da firma, os dois mal conseguem se manter vestidos e tipicamente podem ser encontrados com corpos enrolados.

A química entre eles é palpável. Os olhares elétricos, os carinhos honestos, a luxúria da juventude, e o melhor: o potencial. Logo depois de noivarem, Emily e Luke descobrem que um deles (provavelmente Luke) vai ser promovido na empresa, um ambiente competitivo onde quem não recebe essa cobiçada promoção acaba se demitindo com menos de três anos de emprego. Eles celebram com mais sexo e o sonho de um dia poderem assumir o relacionamento publicamente. Basta que ambos estejam na posição de mandar nos outros. Mas então, Emily é chamada para uma reunião com o chefe de seu chefe, Campbell (interpretado com frieza brutal por Eddie Marsan) às 2h da manhã, e volta para casa com a vaga desejada por seu noivo. À princípio, Luke reage bem, celebrando (sem sexo, dessa vez), as conquistas dela. Então, as coisas começam a sair do controle.

Esse começo sugere Jogo Justo como uma mistura empolgante de Garota Exemplar com Industry, da HBO. Um cativante drama de escritório envolto na embalagem de um thriller sensual onde a única coisa mais difícil do que progredir nesse jogo de milhões de dólares é encontrar o equilíbrio entre a vida pessoal e profissional, especialmente quando a mulher se torna a metade mais bem paga do casal e o homem não é exatamente imune à insegurança. Especialmente neste princípio, quando as coisas estão bem entre os dois, Emily e Luke são personagens magnéticos, e as fenomenais atuações de Dynevor e Ehrenreich mantém nossos olhos grudados na tela sempre que um dos dois está em cena.

Os atores continuam sendo mais do que competentes quando Jogo Justo sai dos trilhos, e Dynevor em especial se mostra capaz de trazer à vida diversas facetas de uma jovem talentosíssima em sua profissão, ciente das dificuldades de ser uma mulher neste ambiente profundamente masculino, mas motivada para vencer. A atriz faz o melhor de cada oportunidade que recebe, e Ehrenreich faz o mesmo. Se, porém, ela têm uma refeição completa para devorar, o ator que um dia recebeu a tarefa impossível de ser um Han Solo jovem precisa se satisfazer com migalhas quando entramos na segunda metade do filme.

É difícil criticar Domont, aqui também operando como roteirista, por não desenvolver tanto o personagem masculino da trama, especialmente quando faltam mulheres tridimensionais como Emily no cinema, mas se Jogo Justo busca investigar as dinâmicas entre os gêneros dentro e fora do trabalho, ambos lados precisam estar afiados. Eventualmente, o tratamento mais raso de Luke se prova fatal para as ambições do filme. Ao longo do segundo ato, Domont literaliza os dilemas do personagem de Ehrenreich das formas mais óbvias, buscando soluções fáceis (ele, claro, começa a ler uma figura meio Jordan Peterson) e atalhos para justificar a frustração crescente pelo sucesso de sua parceira.

Sem firmar bem a personalidade de Luke e aprofunda seu perfil psicológico da mesma maneira que faz com Emily,Jogo Justo eventualmente acelera rumo a uma conclusão explosiva sem nunca nos mostrar a pólvora. A precisão inicial é substituída por melodrama, culminando até na típica cena onde o casal expressa sua raiva através de uma transa irada que termina do jeito mais grotesco e perturbador possível. O jogo erótico e profissional entre os dois acaba virando uma espécie de brincadeira, mas a transformação não parece intencional pela parte de Domont. A diretora ainda guarda algumas grandes cenas para a reta final, particularmente entre Dynevor e Marsan, mas é difícil não imaginar se uma versão mais sútil da obra não se provaria mais brutal.

3/5

Crítica escrita em 23 de janeiro de 2023 no Festival de Sundance. Jogo Justo estreia em 6 de outubro na Netflix.

Nota da Crítica
EstrelasEstrelasEstrelasEstrelasEstrelas
Guilherme Jacobs
ONDE ASSISTIR

Jogo Justo

Drama
Romance
Suspense
1h 53min | 2023
festival-de-sundancealden-ehrenreichcriticafair-playchloe-domontphoebe-dynevor

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