Handling the Undead reencontra a emoção no filme de zumbi

Handling the Undead reencontra a emoção no filme de zumbi

Com atuação forte de Renate Reinsve, drama norueguês está no Festival de Sundance 2024

Guilherme Jacobs
25 de janeiro de 2024 - 5 min leitura
Crítica

Tecnicamente, Handling the Undead é um filme de zumbi. Selecionado para a competição global do Festival de Sundance 2024, o longa da diretora norueguesa Thea Hvistendahl tem todos os marcos das histórias típicas de mortos-vivos, como o momento no qual os cadáveres voltam à vida, derramamento de sangue, tensão lenta e uma grande ideia por trás desse evento.

Quem entrar nessa exploração de luto esperando tiros na cabeça e terror, porém, sairá decepcionado. Concebido como um drama de ritmo lento (mas duração misericordiosamente curta), Handling the Undead encontra sucesso ao cavar fundo para encontrar os efeitos emocionais de ver quem você ama retornando da morte, e rapidamente se mostra desinteressado nos clichês do gênero. A ideia aqui é algo mais contemplativo, o que eventualmente transforma um "zumbi" cujo rosto é reconhecido e amado por personagens em algo muito mais devastador do que uma horda de canibais famintos por cérebros.

O ressurgimento dos mortos nunca é explicado além de um estranho evento que apaga as luzes da cidade, e afeta em especial três núcleos de pessoas cujas perdas foram recentes. Anna (Renate Reinsve) perdeu o filho recentemente, e contempla até o suicídio ao ver o corpo do menino voltar para casa nas mãos do avô Mahler (Bjørn Sundquist). Tora (Bente Børsum) mal se recuperou de enviar o corpo de sua esposa Elisabet (Olga Damani) para a casa funerária, quando acorda com a mulher de volta. Já David (Anders Danielsen Lie) descobre a morte de sua esposa Eva (Bahar Pars) apenas alguns minutos antes de vê-la, novamente, viva.

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Bom, se podemos mesmo chamá-los de "vivos" é exatamente onde Handling the Undead encontra tensão. Com pele acinzentada e olhos vazios, esses zumbis podem até andar, comer e ter algum resquício de emoções ou memórias do passado, mas a profunda lentidão com a qual eles se movem e seu silêncio moribundo quebram, aos poucos, qualquer alívio de ver seu ente querido respirando novamente. À primeira vista, a ausência de um desejo desenfreado por carne humana ou gemidos de dor engana os protagonistas, e por tabela a audiência. Para quem jamais superou a morte de outro, qualquer reencontro pode ser suficiente.

Aos poucos, Hvistendahl força Anna, David e cia. a encararem a realidade, e enfim lidarem com seu luto. Os mortos-vivos viram memoriáveis, lembretes inescapáveis da perda que foi sofrida, e eventualmente não há como fugir da verdade. Na verdade, sua volta da cova só torna o luto, e a necessidade de passar por ele, mais presentes na vida desses personagens, o que dá a alguns dos melhores atores noruegueses da atualidade, como Reinsve e Danielsen Lie, a oportunidade de explorar cuidadosamente o progresso emocional dessa jornada. Ela, em particular, se torna um bom fio condutor para todos os temas do filme.

É uma ajuda importante, já que o roteiro da própria Hvistendahl (adaptando o livro de John Ajvide Lindqvist), é econômico nos diálogos e às vezes depende de soluções muito convenientes para comunicar horror. Ao lado da trilha sonora hipnótica de Peter Raeburn e de um trabalho de som marcante que insere características arrepiantes nos barulhos mais banais, as atuações são os principais meios para construir a atmosfera do filme.

Com isso, quando alguns momentos típicos de filme de zumbi finalmente chegam, como a imagem de um morto-vivo enfiando os dentes no pescoço de alguém, a encenação não é um mero marco conhecido do gênero, e sim o externar das conclusões nas quais os personagens devem chegar. Sim, eles estão mortos. Não há como fugir disso. Mas talvez esse reconhecimento seja necessário.

Handling the Undead não tem previsão de estreia no Brasil. Crítica escrita em 25 de janeiro durante o Festival de Sundance 2024.

Nota da Crítica
EstrelasEstrelasEstrelasEstrelasEstrelas
Guilherme Jacobs

Handling the Undead

Drama
Suspense
1h 37min
criticaguilherme-jacobschippu-originalsfestival-de-sundance-2024handling-the-undeadthea-hvistendahlrenate-reinsveanders-danielsen-liefestival-de-sundance

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