Cannes: Hunt - Crítica do Chippu

Cannes: Hunt - Crítica do Chippu

Estreia diretorial de Lee Jung-jae se mostra um desafio grande demais para o astro de Round 6

Guilherme Jacobs
20 de maio de 2022 - 5 min leitura
Crítica

CANNES - É comum, e até esperado, que filmes de espionagem sejam difíceis de acompanhar. Hunt, a estreia diretorial de Lee Jung-jae vem logo depois do sucesso do ator no centro de Round 6, o hit sul-coreano da Netflix, e mostra a estrela asiática almejando novas alturas. Além de dirigir, ele atua, produz e escreve esse suspense político de alta voltagem. Talvez, porém, o material seja demais para o vencedor do Squid Game.


De novo, não é um problema quando um suspense de espiões requer muita atenção. Entre reviravoltas, traições, passadas de pernas e alianças secretas, esperamos ser pegos de surpresas e desafiados por esse gênero. A premissa de Hunt parece ter saído diretamente de um romance de John le Carré. Na década de 80, dois chefes da agência de segurança sul-coreana, um dos responsável por assuntos domésticos (Jung-jae como Park) e outro por questões internacionais (Jung Woo-sung como Kim) estão investigando um suposto informante norte-coreano infiltrado em sua equipe com o objetivo de derrubar o já instável governo da época. Cada espião passa a suspeitar do outro, e uma batalha interna em busca da verdade se desencadeia.


A ideia é excelente e dá a Hunt um pontapé inicial de eletricidade durante seus primeiros minutos. A sequência na qual o departamento de Park tenta resgatar um desertor norte-coreano com conhecimento da identidade do traidor está a altura de qualquer tiroteio visto em James Bond ou Bourne, e o ritmo acelerado da narrativa, acompanhado pela direção frenética (até demais) de Jung-jae, seguem em alta velocidade até… a estrada acabar. Hunt se vê incapaz de continuar sobrevivendo às custas apenas de sua ideia original, os defeitos começam a aparecer.


Apesar da complexidade de sua trama, o roteiro de Hunt não é complicado. Espião vs. Espião. Mas na tentativa de elevá-lo ao nível de inteligência de algo como O Espião Que Sabia Demais, Jung-jae começa a jogar informações no que deveria ser um desenrolar sem grandes distrações. Flashbacks justificando certas ações de Kim e Park tiram o oxigênio da sala toda vez que interrompem o progresso e tramas secundárias, como escândalos de corrupção no topo da agência sul-coreana de inteligência, deixam a água turva demais para conseguirmos ver com clareza o que está abaixo da superfície. Esse efeito é, em parte, intencional. Mas nas tentativas de confundir a audiência, Jung-jae vai junto.


O melhor exemplo desse problema vem no relacionamento de Park com uma garota adotada pelo agente (Go Yoon-Jung). O que começa como uma tentativa de adicionar camadas emocionais ao personagem rapidamente se transforma em mais uma peça que pode (ou não) fazer diferença na obra maior. De novo, a ideia da vida pessoal e profissional de um espião se misturarem não é algo novo e há potencial dramático nisso, mas Jung-jae não permite que a relação respire ou seja explorada antes de transformá-la numa arma. Quando ela é disparada no terceiro ato, a reviravolta perde qualquer impacto soa como um truque barato em busca de choque.


Mantendo sua direção no 220 durante todos os longos 130 minutos de Hunt, Jung-jae é esquecido dentro do próprio labirinto. Na hora das verdades começarem a surgir, personagens parecem ter pulado etapas inteiras de desenvolvimento e chegado em conclusões salvas da total incoerência apenas pelo ótimo trabalho dos atores principais. Ambos Jung-jae e Woo-sung são âncoras. Se perdemos de vista os riscos políticos e econômicos da teia de aranha que é esse filme, os atores pelo menos tentam segurar a linha emocional. Infelizmente, eles eventualmente são deixados para trás conforme Hunt caminha para uma conclusão bombástica reforçando os limites de um diretor estreante na hora de compor uma sequência de ação empolgante e compreensível.


Esse pode muito bem ser apontado como o problema geral de Hunt. Jung-jae, na direção, ação e roteiro, atirou longe demais. Esse é o tipo de erro que surge já pedindo para ser perdoado. Como criticar alguém que usa seu poder e estrelato para entregar esse tipo de filme? Hunt não é um filme bom, mas é impossível torcer contra ele.

2/5

Nota da Crítica
Guilherme Jacobs

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