
Império da Dor é a versão diluída da história de Dopesick - Crítica do Chippu
A trágica história da crise de opióides dos EUA contada no estilo Netflix

Crítica
É impossível falar de Império da Dor, nova série da Netflix dirigida por Peter Berg, sem falar de Dopesick, seriado com a mesma história lançada pelo Hulu/Star+ em 2021. Ambas se baseiam em livros para contar a saga dos Purdue Pharma para criar uma das maiores crises humanitárias que os EUA já viveu, com os opióides liderados pelo Oxycontin, popularmente conhecido como Oxy.
Berg se inspirou em Pain Killer, obra de Barry Meier, enquanto o projeto de Barry Levinson, que comandou Dopesick, usou como base o livro homônimo de Beth Macy. Os fatos são os mesmos e até a ideia de mostrar várias facetas do problema são repetidas: a farmácia, o médico, o paciente, a polícia, o judiciário, os viciados. A questão maior é que, enquanto Dopesick se atém às transformações lentas e destrutivas da crise, o Império da Dor opta por pincelar esse momento flashbacks, algum senso de humor e relações mais superficiais entre todos os personagens.
A condutora da trama aqui é Edie Flowers (Uzo Aduba), funcionária do governo norte-americano que descobre o esquema da Purdue para espalhar o Oxycontin pelos EUA, lucrar e matar milhões no processo.
O remédio, considerado tão nocivo quanto heroína se usado como prescrito na época, é o argumento inicial para uma história de terror tão assustadora quanto uma possessão. A obsessão de Richard Sackler (Matthew Broderick) na busca soluções para bater recordes e acumular capital às custas de mortes é desesperadora - da mesma forma que seus asseclas, funcionários e o governo americano abraçam a cumplicidade.
A dor da família de Glenn (Taylor Kitsch) ou o fascínio de Shannon (West Duchovny) são periféricos que tentam impactar na construção do drama civil, mas é a emoção da Flowers de Aduba que consegue criar empatia em quem ouve a tragédia pela primeira vez.
Usando o batido artifício de uma história contada a partir de depoimento (colocando vítimas da Purdue na abertura, ao melhor estilo novela da Globo), Berg usa a presença da atriz para vocalizar tudo que está na tela sem o menor pudor, e talvez por isso, lá pro final da série a redenção da personagem perca o impacto. O mesmo acontece com a caricatura de Sackler construída por Broderick - um sujeito com vozes na cabeça, vivendo para cães numa mansão isolada, rodeado de velhos gritadores e incapaz transmite um pingo de vilania se não falar com todas as letras que "não se importa com os viciados".
Assim como Sound of Freedom ou O Escândalo, filmes com temas fortíssimos, mas execução mediana, Império da Dor peca ao decidir pelo superficial e didatismo exagerado para contar uma chaga do sistema capitalista, chegando ao ponto de literalmente mostrar violência como solução (ou desejo).
Dopesick, por sua vez, transforma todos os personagens e aprofunda até os vilões, saindo da prancheta para discutir como essas crises estão muito além dos executivos. Elas passam pela política e um sistema defendido por todos os lados, se apoiando cegamente no lucro e individualidade acima de tudo. Império da Dor é, sem dúvida, impactante, mas não pelos próprios métodos de execução, e sim por contar uma das maiores tragédias da atual geração. A série é uma medicação sem efeito.

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