Succession retorna para última temporada com um de seus melhores episódios - Crítica com Spoilers

Succession retorna para última temporada com um de seus melhores episódios - Crítica com Spoilers

Logan Roy enfrenta seus filhos em capítulo recheado de emoções, tanto ocultas e visíveis

Guilherme Jacobs
26 de março de 2023 - 11 min leitura
Crítica

O primeiro episódio da quarta e última temporada de Succession começa e termina da mesma maneira. Logan Roy (o incomparável Brian Cox) sozinho. A conclusão, com o magnata bilionário assistindo ao noticiário noturno do canal de televisão da Waystar Royco, torna literal a solidão da abertura, quando o vemos caminhando entre seus aliados e admiradores na sua festa de aniversário (uma bela referência ao primeiro capítulo da série criada por Jessie Armstrong). Sim, há dezenas de pessoas à sua volta prontos para sorrir e elogiá-lo, mas o interesse de Logan por elas é basicamente nulo, e assim permanece até a chegada de Tom (Matthew Macfayden) com informações importantes sobre uma aquisição.

Ambas cenas podem ser lidas como o preço da vitória pago por Logan para sair vencendo com a venda de seu conglomerado de mídia para a GoJo, alienando seus três filhos mais novos e garantindo uma saída gloriosa do negócio que lhe rendeu bilhões. A aquisição em questão, da Pierce Global Media (PGM), gerida por sua então rival Nan Pierce (Cherry Jones) é a cereja do bolo. Um último feito para deixar seu domínio ainda maior, sussurrar um "eu venci" para uma adversária e valorizar mais o império prestes a ser vendido.

Mas, assim como a última cena externaliza o sentimento presente em Logan desde o minuto inicial de "The Munsters" (que título!). ela também parece revelar a origem desses sentimentos. Nela, ele fica frustrado com a aparência do âncora do programa, liga para Cyd (Jeannie Berlin) e demanda uma mudança. Logan, descobrimos, ainda se importa. Poderia uma parte dele estar arrependida da venda? Poderia o executivo, que numa fuga do aniversário para comer com seu segurança e confessar suas certezas quanto à vida após a morte (isto é: não há uma), estar refletindo sobre o seu legado neste dia que anuncia a passagem de mais um ano de vida, e consequentemente menos um ano de um vida?

É cedo demais para entendermos o que Armstrong tem planejado para essa grande conclusão, mas, aliado à fantástica atuação de Cox e à direção sutil e precisa de Mark Mylod, ele usa este início de temporada para deixar claro uma coisa: a sucessão de Logan Roy, seja por outra empresa ou por um de seus filhos, colocará o patriarca frente à frente com seus medos e inseguranças, adversidades que ele encara, tipicamente, de maneira brutal como, digamos, ordenar a demissão de um âncora. Esse crepúsculo também o colocará frente à frente com seus filhos.

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Quando os vemos, Kendall (Jeremy Strong), Shiv (Sarah Snook) e Roman (Kieran Culkin) estão tentando arrecadar os fundos necessários para lançar sua nova empresa de mídia: The Hundred. Pensada como uma combinação das publicações mais cool do mercado, como The New Yorker, mas com 100 especialistas escrevendo sobre diversas áreas (se isso funcionaria, na prática, é inteiramente questionável, mas isso sem dúvidas é intencional), a nova iniciativa não é tanto uma competidora da Waystar como uma resposta ao mercado mais generalizado e voltado apenas para números. Se daria ou certo, ou não, é outra história, mas as razões por trás da ideia — tanto a superação da relação tóxica com seu pai quanto a criação de algo seu — são válidas, e representam crescimento. Vemos o trio trabalhando juntos sem deixar os queridos insultos de lado, e mesmo com suas inerentes incompetências, os Filhos Roys parecem estar melhores do que nunca.

Mas, então, a oportunidade de ferrar seu pai aparece.

Com medo de piorar ainda mais a situação do casamento com Shiv, se é que ainda há um casamento para se piorar, Tom faz uma ligação para que ela saiba, caso veja fotos dele com Naomi Pierce (a ex de Kendall e parente de Nan vivida por Annabelle Dexter-Jones), que eles dois são um casal. Shiv fareja o que está acontecendo, e depois de uma rápida investigação ao lado de seus irmãos (enquanto eles mantém investidores importantes do The Hundred do lado de fora), descobre o plano secreto de seu pai para adquirir a empresa dos Pierces.

Shiv não resiste à tentação, Kendall se mostra interessado e Roman, inicialmente, rejeita a ideia. As discussões entre os três são repletas dos diálogos mais afiados pelos quais Succession se tornou Succession, interações com duas ou três possíveis interpretações existindo simultaneamente no texto e subtexto, comunicando acidez e humor em doses iguais de maneira e apagando qualquer espécie de linha divisória entre esses dois tons. As piadas de irmão para irmão (Shiv: "Você pode terminar com seu pinto sugado por uma máquina masturbatória de AI" / Roman: "Vamos torcer.") parecem ser exatamente o tipo de material que um entediado Logan demanda de seus seguidores numa das últimas cenas, quando pede para ouvir piadas.*

*Para ser justo, Logan só precisa escutar as interações entre os Irmãos Nojentos, Tom e Greg (Nicholas Braun), porque essas estão, como sempre, hilárias.

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Esse texto repleto de significados implícitos mas nada ocultos continua afiado quando, após convencer Roman, os Roys partem para a residência Pierce e transformam a empresa de Nan num bem a ser leiloado entre eles e seu pai. Jones acaba roubando o episódio pela maneira inocente como ela deixa claro detestar estar no meio dessa batalha, uma travada por ambos times com ofertas mais e mais altas. É um verdadeiro deleite ver a personagem (e por tabela a atriz) se divertindo com a ironia de usar a competitividade entre o clã inimigo para terminar como verdadeira vitoriosa desse conflito, e US$ 10 bilhões mais rica. Kendall, Shiv e Roman venceram o leilão, mas ninguém ficou mais feliz com o resultado do que Nan Pierce.

E ninguém ficou mais furioso do que Logan Roy. Após deixar implícito durante todo o episódio seu desejo de receber um telefonema dos filhos ausentes no aniversário*, o patriarca acaba conseguindo a oportunidade de falar com eles numa ligação, e transbordando de ira, os parabeniza por "terem dito o número mais alto."

*Connor (Alan Ruck) estava lá, desesperado para encontrar um jeito de manter o 1% de votos que conquistou sem gastar mais US$ 100 milhões para ter mais presença midiática focada em sua fracassada campanha presidencial, e encontrando a resposta no transformar de seu casamento com Willa (Justine Lupe) num stunt publicitário, contra a vontade dela

E eles, por outro lado, não poderiam estar mais satisfeitos. Esse breve momento de sucesso serviu como veneno para os filhos, e agora Kendall, Shiv e Roman (que ao fim do capítulo parece nem se lembrar do The Hundred) ganharam um gostinho do que é ferir seu pai. Eles querem mais. The Hundred não seria, necessariamente, uma competidora da Waystar, mas a nova PGM sim.

Rindo como se fossem crianças, eles deixam claro o motivo de seu júbilo. Enquanto isso, podemos debater se a raiva de Logan se originou apenas por perder sua volta olímpica em cima dos Pierces, ou se ela foi gerado especificamente pelo fato de que essa última vitória foi roubada pelos seus filhos. Novamente, o texto do episódio, um dos melhores da série até hoje, permite que ambas leituras sejam verdadeiras.

Onde o texto deixa de lado a ambiguidade interpretativa e é abordado de forma honesta é no eventual reencontro de Tom e Shiv. Morando separados, eles se veem tarde da noite quando ela volta para o apartamento, agora ocupado apenas por ele, para pegar roupas. Tom tenta puxar uma conversa para que ambos processem sua manobra do final da temporada anterior, mas ela se recusa. O casamento acabou. O que há para discutir? Diz muito sobre Tom que, mesmo com toda essa bagagem acumulada, seu coração parece genuinamente partido pelo ultimato de Shiv, e respondendo à vulnerabilidade da atuação de Macfayden, Snook também se entrega em lágrimas ao recusar até uma última transa como forma de despedida.

As emoções estão à pele, e numa série tão fortalecida pelo seu uso de sarcasmo e duplos sentidos, tal transparência se torna ainda mais impactante. É difícil acreditar que essa será a última interação intensa entre os dois, mas há um clima de finalidade na conversa. Nada mais apropriado. Afinal, essa é uma temporada de finalidade.

Nota da Crítica
Guilherme Jacobs

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