Succession: Por que não há vencedor no final da série, e por que esse é o final perfeito

Succession: Por que não há vencedor no final da série, e por que esse é o final perfeito

Independente de quem termina no comando da CEO, não há como vencer o jogo criado por Logan Roy

Guilherme Jacobs
30 de maio de 2023 - 10 min leitura
Crítica

O post abaixo contém spoilers do final de Succession.

"Tem que ser eu." Kendall Roy não está errado quando diz que se algum dos filhos de Logan Roy deve assumir o posto de CEO da Waystar Royco após a morte do pai, ele é o melhor candidato. Roman vacilou quando teve oportunidade, Shiv não tem experiência na área e Connor nem figura na equação. Há, contudo, um universo entre esse hipotético "se" e a verdade. Se algum dos filhos vai completar a sucessão, é Kendall. Mas quem garante que vai ser um deles?

Como descobrimos em "De Olhos Abertos," o último episódio da série criada por Jessie Armstrong para a HBO, ninguém garante. Por que? Porque, nas palavras do seu falecido pai, nenhum dos herdeiros Roy é uma pessoa séria, e nenhuma pessoa série poderia realmente assumir o comando dessa empresa. Se Armstrong quisesse honrar o que nos revelou cautelosamente ao longo de quatro excelentes temporadas; se ele quisesse manter a lógica da realidade construída ao dramatizar a versão moderna de Rei Lear; se Succession realmente fosse sobre algo além de um jogo de cadeiras para o cargo máximo, então nem Kendall, nem Shiv, nem Roman poderiam "vencer."

Na verdade, a vitória como um todo precisava ser uma vaidade. Succession sempre foi mais sobre o vazio dentro dos personagens vividos com arrogância e vulnerabilidade por Jeremy Strong, Sarah Snook e Kieran Culkin, e como a brutal indiferença incorporada no patriarca de Brian Cox deixou esse vácuo inescapável, mesmo quando ele já partiu. Em "De Olhos Fechados," Armstrong mostra o que realmente poderia preencher esse buraco.

Temos vislumbres, como já tivemos no passado, de como Kendall, Shiv e Roman se alegram quando esquecem da guerra de negócios e se comportam apenas como irmãos; mergulhando à noite na piscina de sua mãe e fazendo bagunça na cozinha. A leveza e camaradagem do momento onde os três voltam a se aliar — uma união forçada quando Lukas Mattson (Alexander Skarsgard) descarta Shiv de seu plano de aquisição da Waystar e posiciona o trio inteiro de fora — só aprofunda o contraste visto quando chega a hora da verdade, e eles se separam.

O momento climático é na reunião do conselho da Waystar, quando a votação está empatada 6 a 6, e Shiv está a um "Não" de matar o acordo com a Gojo de Mattson e efetivar Kendall como o próximo Logan. As dúvidas de Roman foram suprimidas pela violência psicológica (e física) de seu irmão, mas as de Shiv parecem ter aumentado. Quando, exatamente, ela perdeu a confiança? Foi ao ver Kendall sentado na cadeira de Logan e realmente encarar essa versão do futuro? Foi quando chegou sua vez de votar? Foi quando, isolados no lado de fora da sala onde negócios realmente acontecem — uma recriação de sua infância brincando e brigando no corredor enquanto seu pai fazia o mundo girar dentro do escritório — Kendall se desespera e perde totalmente o equilíbrio?

Talvez nunca tenhamos a resposta exata, mas a dúvida tem méritos suficientes para existir. A tragédia Shakespeariana de Succession vem da frustração de Logan Roy ao perceber que nenhum de seus filhos é sério. Todos são crianças perpétuas. Cada um dos três candidatos ao trono professa ter recebido promessas, garantias e propostas do pai, o que revela tanto a maldade manipuladora de Logan quanto o status de dependência emocional de suas crias; ele armou essa armadilha, e eles não conseguem sair dela. Quando Kendall faz seu argumento diante do conselho, ele não tem onde se basear. "O acordo é ruim," ele diz em vão. Não há um feito em sua carreira para onde ela possa apontar e dizer que merece. Tampouco teriam Shiv e Roman se estivessem em sua posição.

A escolha de Tom Wambsgans (Matthew Macfadyen) como CEO, garantida uma vez que a compra é aprovada e Mattson se torna dono do conglomerado de mídia, pode parecer imprevisível aos olhos de quem entendeu a promessa no título da série — haverá uma sucessão — como o anúncio de uma batalha sangrenta entre três diferentes, mas igualmente (in)capacitados candidatos à coroa seria disputada. Observe, porém, qual foi o foco do trabalho de Armstrong e sua equipe, e você encontrará inúmeros exemplos de como Kendall, Shiv e Roman se prejudicaram repetidamente, e nenhuma instância onde eles fizeram uma contribuição substancial para a Waystar.

Entre trancos e barrancos, Shiv e Roman parecem entender em que série estão nos minutos definidores de Succession. Em seu chilique infantil, Kendall mostra que nunca saiu da ignorância. Ele é como um espectador que interpretou Succession como a guerra pelo Trono de Ferro no Século 21, e quando vê a cadeira derreter diante de si, entra em pânico. Shiv se contenta em trocar um relacionamento abusivo com o antigo CEO da Waystar por um casamento quebrado com o novo, e Roman se ausenta inteiramente da equação para sorrir com um Martini na mão. Satisfeito? Livre? Dos três, ele é o personagem cujo destino parece mais vago, e quem talvez precisasse de mais uma cena.

Seja como for, o sorriso sugere o reconhecimento da grande tese de Armstrong: quando todos os envolvidos são pessoas amorais, vaidosas e mercenárias, não há como vencer. Tom, um homem de caráter questionável mas talvez o coadjuvante que mais trabalhou em Succession, assume o cargo de CEO não porque sua competência lhe transforma num vencedor, mas porque sua insistência lhe fez uma esponja de dor. A ironia final de Succession é que a futilidade implícita da posição se torna explícita. Ser CEO não salvaria Kendall, ou nenhum deles, mas diante da nova organização de Mattson, ser CEO é só ser um fantoche bem-pago. O cargo era emocionalmente oco, mas dentro da Gojo, passa a ser profissionalmente insignificante.

Literalmente falando, Mattson é o grande campeão, com Tom como seu fiel escudeiro. Quais as chances, porém, de que eles se tornarão pessoas melhores depois disso? Nenhuma, claro. Seu triunfo, porém, faz jus ao que Armstrong tem dissertado em seus roteiros; Mattson pensa apenas no dinheiro, e Tom aceita ser seu escudo totalmente ciente do quão descartável ele será para o bilionário sueco. Ambos enxergam a realidade pelo que ela é, e por isso são pessoas sérias. Não é a toa que foram eles os personagens a quem Logan confiou seu futuro (vendendo a Waystar) e presente (dando o comando da ATN). Eles podem ter mil falhas, mas eles são reais.

Colocar Tom como CEO ainda permite a Succession nos surpreender. A mensagem por trás dos temas da série também poderiam ser comunicados colocando um dos Roy no comando e mostrando-os perdendo as últimas conexões familiares no processo, mas isso não seria justo diante do que vimos até aqui.

Inúmeras vezes ao longo dessa série, os irmãos Roy recebem chances de deixar a Waystar de lado, de parar de tentar virar seu pai, de interromper o ciclo vicioso de abuso, violência verbal e traição. São portas abertas para caminhos alternativos onde, quer fracassando na criação do The Hundred ou só remodelando a PGN, eles poderiam se remover do tabuleiro criado por seu pai. A tragédia de Succession é que eles nunca conseguem sair da ilusão de que um deles poderia comandar bem a Waystar, e que isso lhes traria felicidade.

"Nós somos uma piada," Roman diz. "Nós não somos nada." É a definição da série. Um discurso que convenientemente coloca em foco a verdade presente desde o primeiro episódio, agora visível para todos.

Nota da Crítica
Guilherme Jacobs

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