Entrevista com o Demônio ganha mais na atmosfera e formato do que no terror que não assusta de verdade

Entrevista com o Demônio ganha mais na atmosfera e formato do que no terror que não assusta de verdade

David Dastmalchian brilha como apresentador de talk-show setentista que apela para o ocultismo para tentar mais audiência

Alexandre Almeida
3 de julho de 2024 - 6 min leitura
Notícias

O desconhecido e o oculto, sempre foram assuntos que chamaram muito a atenção do público na televisão. Se hoje, teorias da conspiração enchem as redes sociais, há alguns anos - ou décadas já -, era na TV aberta e em programas de muita audiência, que esses assuntos volta e meia pipocavam entre uma atração musical e uma gincana com famosos. Aparições de imagens santas, alienígenas, possessões, cultos, tudo era motivo para ficar por minutos, e até horas, enrolando os espectadores para manter os níveis de audiência lá no alto.

Entrevista com o Demônio, filme dirigido pelos irmãos Cameron e Colin Cairnes, utiliza bem essa ideia ao se passar (quase) inteiramente durante a apresentação de um talk-show noturno, estilo Jimmy Kimmel, Jimmy Fallon ou, no Brasil, Jô Soares, por exemplo, na noite de Halloween. A história é apresentada como um found footage, uma fita achada, desse episódio do Nights Owl, programa apresentado por Jack Delroy (David Dastmalchian), que no dia 31 de outubro de 1977, decidiu levar ao palco, um médium, um ilusionista que desvenda charlatões e uma parapsicóloga acompanhada de uma jovem que estaria possuída por um demônio.

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O grande barato do filme é de fato essa ambientação e toda a preparação para o grande momento em que a jovem Lilly (Ingrid Torelli) aparece para a entrevista do título. Os diretores conduzem a história como um falso documentário, dedicando alguns minutos da abertura do filme para uma montagem de apresentação da história de Jack. A escolha da época é precisa, misturando fatos reais como Nixon e a Guerra do Vietnã, a crise dos combustíveis e, claro, as seitas, como a Família Manson, com a história fictícia de Jack Delroy, seu envolvimento com o The Grove, grupo de homens ricos e poderosos que se encontram na floresta e sua disputa de audiência com o apresentador real e ícone dos late shows, Johnny Carson.

É aí que entra o brilho de David Dastmalchian. O ator, acostumado aos papéis mais excêntricos, por assim dizer, cai como uma luva na interpretação desse apresentador, que utiliza todas as firulas da TV, como gargalhadas forçadas e momentos emotivos falsos, para comover o público. O ator aparece em todos os tipos de situação na montagem inicial, de um joguinho bobo, até um momento constrangedor com um entrevistado e o drama de levar a própria esposa com câncer terminal ao programa. Quando o episódio do Halloween começa, David some ainda mais por trás do personagem e Delroy nos leva até a apresentação bizarra do médium Christou (Fayssal Bazzi), misturando momentos de espanto e descrença do apresentador.

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O grande ápice do filme é de fato a apresentação de Lilly, uma menina que foi encontrada em uma casa onde acontecia um culto ao demônio. Ela é figura central do livro que está sendo lançado pela parapsicóloga June (Laura Gordon), que adotou a menina. Ela só aparece no programa já na metade do filme e como em qualquer bom roteiro, é no midpoint o momento em que a jornada do protagonista não voltará a ser como antes. Torelli entrega uma ótima atuação, misturando o bizarro com a estranheza daquilo ser real ou não. É também o momento em que o filme utiliza de forma surpreendente todos os efeitos especiais que o baixíssimo orçamento pode oferecer.

E se a apresentação de Lilly é impactante, os momentos seguintes, focados no cético ilusionista Carmichael Haig (Ian Bliss), colocam Entrevista com o Demônio na categoria filme de terror que não dá medo. Isso acaba sendo um problema para o terço final da história, quando o jogo de gato e rato entre o oculto e o incrédulo não deixa que a possessão realmente chegue para perturbar a trama. O filme se torna muito menos terror e muito mais mistério de Além da Imaginação. Mesmo com todo o sangue e mortes na tela, é muito mais sobre a curiosidade do que sobre o medo.

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Se o formato do filme é um de seus melhores elementos, ele também se perde quando deixa de lado as imagens do Night Owls, para mostrar cenas por trás das câmeras nos constantes intervalos do show. Há uma quebra na experiência. Toda aquela imersão que nos prende ao programa colorido, cai por terra nas imagens em preto e branco mostrando o drama de Delroy em perder o programa ou seus patrocinadores. Jack some e voltamos a ver Dastmalchian. O mesmo vale para toda a sequência final do filme, que, mesmo interessante, ainda parece esquecer tudo que foi estabelecido narrativamente pelo formato até ali.

Entrevista com o Demônio é um ótimo exercício criativo do gênero. Se apoia em um conceito e consegue ótimos momentos, até que decide esquecê-lo de vez. É como se fizessem um found footage do Domingo Legal, com o Toninho Diabo e o Padre Quevedo se estapeando e discutindo. É divertido assistir, ficamos na dúvida se acreditamos ou não, mas nunca nos deixa com medo realmente.



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