Homem-Aranha: Sem Volta Para Casa é uma linda celebração de Peter Parker - Crítica com spoilers
Filme captura e comemora a essência do Homem-Aranha
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Esta é uma análise com spoilers de Homem-Aranha: Sem Volta Para Casa. Se desejar um texto sem spoilers, clique aqui.
Peter Parker comete erros. Essa é, talvez, a característica mais definitiva do personagem novamente interpretado por Tom Holland em Homem-Aranha: Sem Volta Para Casa. Ele toma decisões erradas constantemente. Como garoto do Queens, ele perde namoradas, se atrasa para eventos em família, é demitido e mal consegue pagar o aluguel. Como super-herói, ele é derrotado, sofre perdas, acidentalmente ajuda na origem de vilões e nem sempre salva o dia. Mas se há outro atributo inseparável desta criação de Stan Lee e Steve Ditko, é sua capacidade de nunca desistir - não só de sua missão, mas de sua índole.
Ele pode questioná-la, perder sua fé ou ser abalado por causa de um simbionte alienígena, mas no fim do dia, Peter Parker vestirá a máscara novamente e tentará salvar mais uma pessoa. Homem-Aranha: Sem Volta Para Casa é uma celebração disso. Tanto uma conclusão da trilogia inicial de Holland como uma culminação da história cinematográfica desta franquia, o longa é uma comemoração de duas décadas de cinema do super-herói mais famoso e adorado da Marvel com o retorno de Tobey Maguire e Andrew Garfield como encarnações passadas do personagem servindo para encontrar nas linhas comuns entre eles o poder, essência e natureza dessa conhecida narrativa.
Quando Peter deu os óculos da Indústria Stark para o Mistério, ele cometeu seu primeiro erro e, como consequência, sua identidade foi revelada para todo o mundo. Ao tentar recrutar a ajuda do Doutor Estranho (Benedict Cumberbatch) para fazer o planeta esquecer esse fato e mudar muito os parâmetros da magia usada pelo Mago, Parker erra novamente e traz para seu universo uma série de vilões com conhecimento do menino por trás da máscara - o Dr. Octopus de Alfred Molina, o Electro de Jamie Foxx, o Homem-Areia de Thomas Haden Church, o Lagarto de Rhys Ifans e o temível Duende Verde de Willem Dafoe, cujo retorno ao papel permanece assustador.
Então vemos, mais uma vez, o caráter deste personagem. Com incentivo de sua Tia May (Marisa Tomei), Parker se recusa a simplesmente enviar os antagonistas de volta aos seus universos se o destino deles for simplesmente morrerem em fins trágicos. Ele quer curá-los. Ajudá-los. É claro. É uma segunda chance. Quem comete erros sempre deseja isso. Como ele poderia negar fazer o mesmo com seus novos adversários?
O roteiro do filme trabalha de maneira conveniente demais a batalha contra o Doutor Estranho e sua ausência subsequente, retirando o feiticeiro da jogada rapidamente para colocar Peter sozinho. O Matt Murdock de Charlie Cox aparece, mas só como advogado. Tony Stark (Robert Downey Jr.) não vai voltar. Ele consegue lidar com os cinco? A lógica da situação é questionável, mas o arco emocional funciona bem, particularmente quando vemos o herói restaurando Octavius ao seu estado normal. Molina, um dos grandes atores a passar por filmes de quadrinhos, entrega uma atuação tão boa quanto no seminal Homem-Aranha 2, e seu olhar de gratidão ao ver como Parker silenciou seus tentáculos faz esse plano aparentemente absurdo de salvar os vilões não só convincente, como necessário.
Os vilões de Peter Parker, em grande parte, são tragédias. Celebrar a história do Homem-Aranha também significa observar com carinho os homens com os quais ele luta. Norman Osborn é, essencialmente, bipolar. Max Dillon só queria ser notado. Flint Marko foi um acidente trágico. Curt Connors queria se sentir completo. Como vilões, o filme transforma alguns deles em caricaturas. As motivações e alianças do Homem-Areia parecem mudar como sopro, o Lagarto (cujo CG é bem inferior) mal tem personalidade e Electro é totalmente diferente, uma mudança salva pelo carisma e humor de Foxx. Mas apesar disso, é possível simpatizar com eles.
Dafoe, outro dos grandes artistas a passar por essa franquia, é tão convincente como Norman quanto como Duende. Quando ele vai em busca de May para pedir ajuda, o ator parece um senhor de idade com problemas psicológicos, alguém desesperado, perdido e assustado. Como não ajudá-lo? Como não ajudar todos eles? O grande coração de Peter está disposto a abraçá-los quase incondicionalmente, e isso, claro, traz riscos pelos quais ele precisará pagar. Mas, como ele é lembrado - dessa vez pela tia, não o tio - com grandes poderes vêm grandes responsabilidades. A morte de May custa caro para nosso herói, mas mesmo em seus momentos finais ela insiste: ele fez o certo. Peter, entretanto, discorda.
E é por isso que a inclusão de Tobey Maguire e Andrew Garfield funciona tão bem. Claro, adoraríamos vê-los de qualquer forma. Suas entradas, em minha sessão, geraram gritos tão grandes ou até maiores dos que os ouvidos na chegada de Thor em Wakanda, quando Steve Rogers levantou o martelo, ou mesmo quando todos os Vingadores foram avante contra Thanos. O fanservice está la. Mas onde o diretor Jon Watts e os roteiristas Chris McKenna e Erik Somers elevam o material é em justificar a presença dos dois atores num nível emocional.
Seus Peters, afinal, também foram culpados pelas mortes de pessoas amadas. Eles são (parcialmente, no mínimo) responsáveis pelo falecimento de uma Gwen Stacy, de um Harry Osborn e de dois Tios Ben. Mas eles também ouviram a mesma frase, dita pelos antigos Tios e pela nova Tia May sempre na noite de sua morte, sobre poder e responsabilidade. Eles entendem. Maguire e Garfield retornam aos papéis adicionando mais peso, mais solenidade e experiência. Quando falam, parecem serem a voz da razão. Seu encontro com Holland é um dos momentos mais emocionantes e tocantes de todo o universo Marvel, uma cena enriquecida pelo contexto dos atores, como se o novato precisasse dos guias não só na ficção, como na realidade.
Mas também é ótimo vê-los se divertindo juntos. O Homem-Aranha nunca foi sério ou sombrio demais, a não ser quando precisa ser para fins de contraste narrativo. Garfield e Maguire aparentam estar se divertindo mais aqui do que em seus últimos trabalhos como o herói, e Holland personifica a audiência em seu espanto infantil. A dinâmica entre os três é um dos grandes créditos do filme, reforçando a qualidade e particularidade de cada um. Holland sabe trabalhar em equipe e cresce como líder, Maguire é o mais sábio e incorruptível em seu caminho, Garfield sofreu mais perdas e por isso entende o perigo da escuridão na qual o Peter do MCU se encontra, uma certeza recompensada quando ele salva a MJ de Zendaya do mesmo destino da Gwen de Emma Stone. O momento é totalmente telegrafado, mas funciona de maneira impecável em grande pela atuação de Andrew na hora.
Ele é, provavelmente, o melhor dos três atores a passar pelo personagem. Se é o melhor Peter, podemos debater, mas sua evolução como ator é incontestável. É admirável, então, ver como Holland está a altura dos seus antecessores. O novo Peter faz aqui sua melhor atuação não só no papel, como em toda sua carreira, se mostrando de forma mais convincente no drama sem perder seu charme, mas também carregando o filme como nunca fez antes. Sim, Cumberbatch está aqui, mas ele não serve a função de tutor exercida por Downey Jr. em De Volta ao Lar e, parcialmente, por Jake Gyllenhaal em Longe de Casa. Peter, e Tom Holland, precisam assumir o posto central, pedalar sem rodinhas, crescer.
A conclusão de Sem Volta Para Casa, solucionado quando Peter faz todos esquecerem não só sua identidade secreta, mas sua pessoa como um todo, serve como fechamento do que acabou sendo uma trilogia de origem e amadurecimento para o herói, e um soft-reboot para posicioná-lo de maneira mais clássica (e, consequentemente, para a Sony fazer filmes mais independentes do MCU na narrativa. Nenhum Vingador lembra dele, afinal). Sua roupa nova tem cores mais vibrantes e é costurada em casa, ele não mora num apartamento com tecnologia Stark e nem tem um emprego garantido na empresa de Tony, mas ele é o Homem-Aranha, talvez agora mais do que nunca.