Opinião: Com filme do Gollum, Senhor dos Anéis entra na sua era Marvel

Opinião: Com filme do Gollum, Senhor dos Anéis entra na sua era Marvel

Franquia de fantasia retorna aos cinemas em 2026, e a Warner Bros. não vai parar por aí

Guilherme Jacobs
9 de maio de 2024 - 5 min leitura
Notícias

Era questão de tempo. Um novo filme de O Senhor dos Anéis, batizado provisoriamente de A Caça por Gollum, estreia em 2026. Desde que a Warner Bros., estúdio que lançou os filmes de O Senhor dos Anéis e O Hobbit, anunciou que estava trabalhando com a nova detentora dos direitos da franquia para novos títulos no cinema, esse era o único final possível, e ele finalmente está aqui.

A Caça por Gollum, curiosamente, é o título de um fan-film lançado no YouTube com base nos apêndices dos livros de Tolkien que revelam Gandalf e Aragorn caçando Gollum antes dos eventos da trilogia principal (ou seja, não descarte versões mais jovens dos personagens de Viggo Mortensen e Ian McKellen). Mas J.R.R Tolkien, naturalmente, não deu muitos detalhes dos acontecimentos, e os fãs inventaram muita coisa. A Warner fará a mesma coisa. Só que o problema maior não é esse (quem sabe os roteiristas pensem numa ótima ideia?). Mais preocupante é o que isso revela sobre como a Warner vai trabalhar O Senhor dos Anéis daqui pra frente.

Com Andy Serkis de volta ao papel de Gollum, e também assumindo as rédeas de diretor, e Peter Jackson como produtor, a Warner faz a aposta mais óbvia possível e reflete a filosofia de seu CEO, David Zaslav, que também aprovou um novo filme de Matrix (o primeiro sem Wachowskis desenvolvendo) e um remake de Harry Potter em forma de série. Veterano do mundo dos negócios, mas não do cinema, o executivo pouco se importa em respeitar qualquer ideia de santidade associada a esses títulos. Se a Warner tem o IP, ela irá miná-lo até que não reste nada.

Claro, Senhor dos Anéis já foi minado. Depois de uma trilogia praticamente perfeita, foi a Warner, junto do próprio Jackson, que esticou O Hobbit, um livro pequeno, para uma trilogia mediana. Há a série Os Anéis do Poder na Amazon, e um filme animado, A Guerra dos Rohirrim, agendado para dezembro de 2024. Todos esses projetos, porém, adaptam obras ou histórias situadas em outras eras, momentos e batalhas. Claro, um personagem visto no cinema pode aparecer aqui ou ali, um local pode ser replicado e referências são inevitáveis.

Mas nada disso é um filme que soa exatamente como o tipo de derivado hoje associado à gestão da Marvel Studios, que gosta de aproveitar personagens populares num determinado título para fazer outros filmes e séries. Já era especulado que a nova era de Senhor dos Anéis na Warner seria centrada nos principais nomes da Terra-Média, como Aragorn e Gandalf, e a escolha de Gollum só confirma isso.

É ingenuidade demais sonhar com alguma espécie de respeito à mitologia na Hollywood atual, mas a trilogia de O Senhor dos Anéis lançada na virada do século, apesar dos tropeços de algumas adaptações posteriores, seguia como um objeto milagroso e intocado. Outros projetos na Terra-Média eram inevitáveis, mas ninguém, até então, ousava tocar naqueles três filmes. A partir de hoje, esse limite não existe mais.

A presença da dupla Serkis e Jackson parece tentar validar essa decisão, mas é difícil não ficar preocupado. Desenvolver derivados é uma prática mais fácil quando se fala de Marvel ou DC, propriedades vindas de quadrinhos que já seguem a lógica de apresentar um herói numa história e depois colocá-lo como protagonista de outra revista. Essa proposta, contudo, já se mostra mais arriscada em algo como Star Wars, mesmo esse universo seja, há décadas, expandido em livros e animações. Andor é uma obra-prima. Mandalorian é divertido. Obi-Wan? Boba Fett? Ascensão Skywalker? Nem tanto.

O que dizer, então, de O Senhor dos Anéis? Tolkien, claro, escreveu mais do que sua trilogia mais conhecida e O Hobbit, mas há uma centralidade em sua obra. Ela tem seus principais capítulos, e adaptá-los deu muito certo. O que acontecerá quando a Warner decidir aplicar essa lógica tão danosa de Hollywood na criação de uma história que pode até beber da mitologia do autor, mas que será, inevitavelmente, uma produção feita com a expansão comercial da marca como principal objetivo? Hoje, é difícil ser otimista.

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