O Senhor dos Anéis: Os Anéis de Poder inicia 2ª temporada com 1º episódio focado em Sauron - Crítica e Resumo
Leia nosso resumo e análise do primeiro episódio da segunda temporada da série de O Senhor dos Anéis
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Até pelas várias alusões bíblicas, O Senhor dos Anéis está enraizado em noções clássicas da luta do bem contra o mal, algumas das quais sofrem quando adaptadas para produções audiovisuais de estúdios que precisam agradar um público diverso no Século 21. Mudanças ocasionalmente são feitas em Os Anéis de Poder, e a necessidade delas jamais será válida para os mais puristas, que tipicamente exageram o grau de impacto das mesmas. Uma coisa, porém, a série da Amazon mantém de maneira indiscutível, e com bons efeitos. Essa é uma história sobre trevas e luz.
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O primeiro episódio da segunda temporada, já disponível no Prime Video, reforça isso enquanto dispensa qualquer visão reducionista desse conflito. Há uma razão pela qual a humanidade tira drama, comédia, suspense e romance da velha luta há séculos, e por quê J.R.R. Tolkien conseguiu construir o mais rico universo fictício de toda a fantasia a partir do que muitos interpretam como uma metáfora do cristianismo vista a partir das lentes da arte, narrativa e música. No fim das contas, essa pode ser muita tensão entre dois lados bem determinados, mas as divisões internas de ambos, assim como a tentação para cruzar, borrar e quebrar a linha os dividindo gera combustível o suficiente para que este modelo narrativo tão familiar continue dando frutos.
Essencialmente dividido entre quatro grupos — dois “do bem” e dois “do mal” — este capítulo inicia, como foi na primeira temporada, com uma sequência arrebatadora. Neste caso, vemos a queda e ressurgimento de Sauron (Jack Lowden, de Slow Horses, imediatamente superior ao pouco dinâmico Charlie Vickers, que assume o personagem depois de seu retorno nojento), que após a derrota de seu mestre Morgoth tenta convencer os uruks, e Adar (Sam Hazeldine, no lugar de Joseph Mawle, que deixou a série), a seguir seu domínio. Logo antes de ser coroado com sua icônica coroa, Sauron é atacado primeiro pelo elfo sombrio, e depois por todos os seus seguidores, e termina explodindo num misto de sombras, gelo e neve que muda toda a terra ao seu redor. Seu corpo, então, se dissolve num líquido negro.
Mostrar o processo seguinte — com Sauron basicamente se transformando na simbionte de Venom e engolindo todo tipo de criatura rastejante até começar a formar um novo corpo humanóide, que eventualmente se revela com o rosto de Vickers — é uma aposta, já que momentos de pura mitologia fantástica podem ser melhor servidos pela imaginação, e não encenação. O risco valeu à pena. A sequência é infestada pela sensação de maldade e perversão. É o tipo de apresentação que retifica o perigo do vilão, deixa claro como é difícil matar esse parasita e ilustra sua principal atividade: sugar a vida dos outros para se fortalecer. A abertura termina com o outro lado de seu primeiro encontro com Galadriel (Morfydd Clark), quando suas ações deixam o campo de mortes violentas para dar lugar à manipulação e mentiras.
A maior delas, na primeira temporada, foi oferecer aos elfos os Anéis de Poder como uma solução para o apagar de Lindon, que forçaria os elfos a deixar a Terra-Média. As consequências dessas ações são palpáveis e complicadas na hora inicial da segunda temporada, e melhor resumidas por Cirdan (o sempre excelente Ben Daniels como o elfo conhecido como “o Construtor de Navios”) quando, ao ouvir Elrond (Robert Aramayo) falar sobre sua intenção de destruir os anéis apesar dos protestos de Galadriel e Gil-galad (Benjamin Walker), diz: “se ele virou elfo contra elfo, talvez já tenha obtido sucesso.” Quem conhece a mitologia de Tolkien, ou viu a trilogia de Peter Jackson, já sabe que isso é verdade. A existência dos anéis oferece uma saída fácil para elfos (e, depois, homens e anões), perpetuando seu tempo na Terra-Média mas deixando-os vulneráveis a Sauron e, futuramente, ao Um Anel.
Mas qual é a outra escolha? Se seguirem o caminho de Elrond, como os elfos parecem destinados a fazer uma vez que Cirdan leva os anéis para destruí-los, os elfos deixarão a Terra-Média durante a ascensão de Mordor e logo após saberem do retorno de Sauron. Como ficam aqueles que não têm chance contra a escuridão? Para a frustração de Elrond, Cirdan muda de ideia e, no meio do que parece a cerimônia fúnebre de Lindon, retorna com os três anéis, que passam a figurar nos dedos dele, de Gil-galad e Galadriel. As folhas retornam à árvore, que brilha com força.
Mas por mais que o momento tenha um cântico de triunfo, é difícil não sentir um gosto amargo. A que custo veio essa vitória? O épico de Tolkien conta que os elfos precisaram deixar a Terra-Média após vencer Sauron, já que a destruição dos anéis leva ao fim a mágica que permite que eles vivam eternamente lá. Eles saem melancólicos, outro exemplo de como Tolkien evita soluções binárias e simples, mas leitores (ou espectadores) sentem que o sacrifício foi válido. Aqui, temos o inverso. Os elfos conseguem o que querem, mas em nenhum momento há a ilusão de que a conta sairá barata.
Isso é o grande mérito desse episódio, que divide suas atenções também com o Estranho (Daniel Weyman) buscando respostas ao lado de Nori (Makella Kavanagh) e sua melhor amiga Poppy (Megan Richards). Neste núcleo sim, há tons de pura bondade, o que contrasta bem com o terceiro núcleo do episódio, onde Sauron está preso pelas forças de Adar. Os dois rivais se separam depois que Sauron engana seu antigo algoz, mas enquanto juntos, os dois mostram que até dentro do mal há diferentes tons. A intenção dos showrunners J.D. Payne e Patrick McKay com esses dois vilões é clara, mas a execução é barata e óbvia — Sauron controlando criaturas para matar seus opressores é um tanto quanto cartunesco.
Felizmente, Sauron termina deixando o lugar e indo até Celebrimbor (Charles Edwards), onde ele deve se passar por Annatar, o senhor dos presentes. Isso coloca o personagem na posição de fazer mais do que fez deste episódio tão eficaz: mentir.