The Flash equilibra nostalgia e aventura com bons resultados - Crítica do Chippu
Ezra Miller faz bom trabalho de segurar o filme de Andy Muschietti
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Se formos mergulhar no contexto da produção de The Flash, é justo dizer que o resultado é a prova do talento e resiliência do diretor Andy Muschietti. O projeto está há quase uma década em Hollywood e nunca viu a luz do dia, seja pelos roteiros reprovados, demissão de equipes ou problemas na gerência do estúdio. Como se não fosse suficiente, o cineasta enfrentou uma pandemia durante as filmagens, a venda da Warner para Discovery e uma crise intensa com a prisão e denúncias contra o protagonista Ezra Miller.
Por tudo isso, Flash é um produto que mistura influências de diversos momentos do gênero de heróis no cinema, com referências ao mundo do Batman vs Superman de Zack Snyder, passando pelo tom da Liga da Justiça e Vingadores de Joss Whedon, e o ar família de quase todos os filmes da Marvel. A boa notícia é que, mesmo sendo esta amálgama de inspirações, o que prevalece é a ideia de Muschietti em tornar o drama de Barry Allen o motor da história, sendo ajudado por coadjuvantes relevantes, mas que não ofuscam o protagonismo do personagem-título.
Tal qual o arco Flashpoint, Barry Allen volta no tempo para salvar a vida da própria mãe, mas se vê num paradoxo em que ele destrói boa parte da sua própria história e altera o passado, o presente e o futuro. Agora, em um outro universo e com a ajuda de um Batman alternativo, interpretado por Michael Keaton, e uma versão dele mesmo sem poderes, o herói tenta reconstruir a linha do tempo e voltar para sua realidade. No meio dessa bagunça, ele conhece uma prima do Superman e revê o General Zod (Michael Shannon), que assim como em Homem de Aço, está em busca de uma fonte de DNA para reviver Krypton - nesta realidade, ao invés de enfrentar Superman, ele enfrenta Kara, a Supergirl (Sacha Calle)
A trama mirabolante é explicada de forma simples e com alusões à cultura pop, como não poderia ser diferente em um filme de herói dos últimos 20 anos. No entanto, o acerto de Muschietti é não desviar a atenção do drama familiar de Allen, que serve também como conexão dele com o Batman de Keaton. Por mais que as uniões sejam circunstanciais e mais protocolares do que o normal, as intenções por trás do texto ficam claras: os personagens se unem pelo trauma, pelo medo de seguir com as mesmas feridas e não serem capazes de curá-las. Enquanto Batman tenta ensinar sobre a importância de cicatrizes e o legado delas, Flash é o jovem ansioso (literalmente) para resolver os problemas o mais rápido possível, mesmo que isso signifique falhar a todo momento e destruir tudo ao redor.
Keaton aparece na medida perfeita para o coadjuvante de uma aventura como essa. Protagoniza cenas de ação que enchem os olhos dos fãs, solta meia dúzia de frases de efeito e faz o mínimo do ar paternal que Flash precisa. Kara, vivido por Sacha Calle, é um adendo menos envolvido na parte dramática, e assim como o Batman, se torna mais problemática ao passo que o filme se encaminha para o fim, já que as resoluções de ambos se tornam mais gratuitas do que circunstâncias - o roteiro se vê na necessidade de conectar os pontos e muitas vezes o faz de forma desinteressada, apelando para justificativas que deixam o drama de lado. Tudo isso é apresentado em uma sequência infinita de ação em um deserto de computação gráfica, onde luzes, poeira, raios e explosões se misturam em uma confusão de efeitos em que pouca coisa importa ou tem peso - especialmente no vai e volta que Barry se propõe a fazer.
Mesmo nessas idas e vindas de pouco impacto, Flash se mantém firme numa narrativa coerente com o herói principal, muito bem interpretado por Miller. Incubido de ser o protagonista duplo, o ator consegue achar o equilíbrio ideal entre comédia e drama, inocência e heroísmo que o personagem necessitava desde sua primeira aparição. Os dois Barrys são a melhor parte de Flash, pois não reagem somente como fãs de cabeça vazia e piadas sem graça dos filmes de Zack Snyder, eles são conscientes da jornada que vivem dentro da história. E não por acaso Barry aqui é relacionável por ser um fã de cultura pop, mas também pela fragilidade infantil que possui e se assemelha a tantas crianças e adolescentes nos dias de hoje, hiperativos, ansiosos, conectados 100% do tempo e impacientes até para comer alguma coisa.
O maior trunfo de Flash é ser uma boa aventura de família como qualquer ótima animação da Liga da Justiça que foram feitas nos últimos anos, ou como ótimos quadrinhos escritos nas últimas décadas. Ele se preocupa com as conexões emocionais entre os personagens, as torna relacionáveis para a audiência, fala sobre traumas e dramas, distribui serviços para os fãs mais ávidos, e faz tudo isso sem precisar ser presunçoso ou cínico, dando as camadas e a importância necessárias para uma franquia tão maltratada recentemente.
4/5